Arlete Cunha e Letícia Schwartz estão no elenco desta emocionante montagem que ocupa a Sala Álvaro Moreyra, no Centro Municipal de Cultura até 29 de outubro
A montagem que estreou com quatro sessões lotadas no Teatro do Centro Histórico-Cultural Santa Casa, poderá ser conferida até 29 de outubro, sextas e sábados, às 20h e domingos às 19h, na Sala Álvaro Moreyra, no Centro Municipal de Cultura. Na semana que antecede a estreia será lançada uma campanha de financiamento coletivo na plataforma Apoia.se, com o título “As doze noites de Raiz Amarga”. A iniciativa visa arrecadar fundos para viabilizar os custos operacionais desta temporada independente.
Com dramaturgia de Clóvis Massa e Letícia Schwartz, a partir de textos de Letícia Schwartz, o projeto nasceu em meados de 2020 quando Letícia, atriz e áudio-descritora, convidou Clóvis Massa, diretor e professor titular do Departamento de Arte Dramática da UFRGS, para desvendar possíveis caminhos dramatúrgicos na construção de delicado material de memórias: os relatos de sua avó, Reli Blau, uma sobrevivente do Holocausto. Como contar essa história? O Sêder de Pessach, a páscoa judaica, surge como resposta: rememorar um trauma através de um ritual de celebração da vida. A partir disso, constroem juntos o roteiro e a encenação da peça Raiz Amarga. A montagem teatral mescla as memórias da atriz com as etapas, histórias e cânticos que envolvem o ritual da primeira noite da páscoa judaica. Ao lado de Letícia, a atriz Arlete Cunha une-se à celebração do Pessach onde o público é convidado a partilhar alimentos, traumas e alegrias da família cuja matriarca foi uma sobrevivente do campo de extermínio de Auschwitz. A direção é de Clóvis Massa.
A disposição cenográfica propicia a proximidade das atrizes com os espectadores propondo que cada pessoa seja potencialmente afetada pelos testemunhos verídicos de maneira sensível. No dispositivo cênico da montagem, situado diretamente no palco, o público é convidado a vivenciar a experiência do ritual dentro da caixa cênica, transformada em sala de jantar: o manuseio de mesa, cadeiras, pratos, taças e vinho, além de comidas que resguardam o simbolismo da fuga do povo judeu do Egito, fornecem à atmosfera do espetáculo a dose necessária de intimidade para sua acomodação, com as atrizes contando histórias e tecendo comentários pontuais, olho a olho, sobre os acontecimentos tratados de acordo com as etapas do ritual.
A temática presente na noite de Pessach, em que se recorda a história do Êxodo e a libertação do povo de Israel, é atravessada pela trajetória da família de Letícia, de sua avó sobrevivente do campo de concentração de Auschwitz e do impacto do Holocausto nas gerações seguintes. Desse modo, os principais momentos da cerimônia da páscoa judaica servem como marcos para abordar o sofrimento dos judeus na Segunda Guerra Mundial, mas também a repressão submetida a outras minorias até os dias de hoje. “Busca-se acolher um público de forte tradição cultural e artística, mas que raramente se encontra representado no teatro gaúcho, ao mesmo tempo em que se pretende, por meio deste universo particular, tratar de temas que atingem diretamente outras comunidades”, afirma a equipe de Raiz Amarga.
“Narrar o trauma”, pelo diretor Clóvis Massa
A entrevista de Reli Gizelstein Blau concedida à USC Shoah Foundation, em setembro de 1997, em que fala da experiência como sobrevivente dos campos de concentração de Auschwitz-Birkenau, foi a fonte documental escolhida para o início do processo de criação de Raiz Amarga, ainda nos primeiros meses de 2020. A abordagem, que remete à tradição da literatura produzida após os extermínios ocorridos na Segunda Guerra Mundial, aos poucos foi dando lugar ao testemunho de Letícia Schwartz, sua neta, que lindamente emprestou sua voz para narrar os traumas de muitas pessoas vitimadas – como foram seus ancestrais –, mas também recordar suas lembranças dentro de uma família que, como tantas outras, de diferentes origens e etnias, foram e ainda são atravessadas por questões de identidade, perseguição e reconstrução em suas vidas.
Enquanto processo complexo em que está envolvida a dialética da recordação e do esquecimento, a dramaturgia de testemunho assim constituída passou a considerar o Seder de Pessach como referência estrutural, ele próprio uma narrativa de testemunho coletivo. A noite de celebração da libertação dos judeus do jugo opressor no Egito antigo passou a ordenar a narrativa. Associado aos relatos sobre o genocídio e à exposição dos traumas sofridos pelas gerações posteriores, o Seder oscila entre dois tipos de testemunho presentes na dramaturgia, segundo Jean-Pierre Sarrazac, o da narração de um acontecimento presenciado e o da exposição do próprio sofrimento por alguém que é testemunha de si mesmo. No espetáculo, esses tipos, que podem ser chamados de político e de íntimo, conduzem ao pressuposto fundamental de lembrar de quem se é, a fim de garantir a preservação de uma memória viva e impedir que novos horrores deste tipo ocorram.
Após a finalização do texto autoral de Letícia, em forma de monólogo ainda, ele sofreu várias transformações. A primeira delas, ainda no período de isolamento devido à pandemia, num tratamento mais voltado à encenação. Nos primeiros dias de 2022, numa adaptação mais radical em forma de diálogo, quando convidei Arlete Cunha para fazer parte do espetáculo. A extraordinária experiência de Arlete em processos de natureza ritual, atriz que sempre admirei e com quem nunca tinha trabalhado, enriqueceu imensamente nosso trabalho durante os ensaios, e sua interlocução com Letícia equacionou o tom das falas, dando à cena o contraponto que faltava à narrativa, trazendo a alternância entre momentos densos e espirituosos.
A concepção do dispositivo, inspirada em um trabalho do artista francês Charlie Windelschmidt, colabora para a aproximação com as pessoas convidadas para o Seder, sentadas ao redor da estrutura cenográfica. A ambientação reflete o afastamento da fábula e enfatiza a presentificação, permitindo com que situações relatadas sejam evocadas pontualmente. Em nossa proposta, a ênfase testemunhal, por meio do relato, se coloca como um desafio, numa cerimônia para poucos, de reforço da simples presença, que recusa os excessos tecnológicos para trazer um pouco de luz às sombras que ameaçam nossas memórias.
SERVIÇO:
O que: RAIZ AMARGA – Por que esta noite é diferente de todas as outras?
Quando: Até 29 de outubro
Sextas e sábados, às 20h
Domingos, às 19h
Ingressos antecipados via Sympla
Inteira: R$ 50,00 + taxas
Meia-entrada: R$ 25,00 + taxas (estudantes, idosos, professores, pessoas com deficiência e jovens de baixa renda com cadastro no CadÚnico)
Link: https://www.sympla.com.br/evento/raiz-amarga/2151634
Ingressos na hora em dinheiro ou PIX (bilheteria abre uma hora antes do início do espetáculo)
Inteira: R$ 60,00
Meia-entrada: R$ 30,00 (estudantes, idosos, professores, pessoas com deficiência e jovens de baixa renda com cadastro no CadÚnico)
FICHA TÉCNICA
Elenco | Arlete Cunha e Letícia Schwartz
Direção | Clóvis Massa
Dramaturgia | Clóvis Massa e Letícia Schwartz a partir de textos de Letícia Schwartz
Depoimentos | Reli Gizelstein Blau*
Produção | Naomi Siviero
Assistência de produção | Carla Cassapo
Iluminação | Carol Zimmer
Cenografia e ambientação | Clóvis Massa
Cenotécnica | Rodrigo Shalako
Trilha sonora | Daniel Roitman
Figurinos | O grupo
Audiodescrição | Mil Palavras Acessibilidade Cultural
Consultoria de cultura judaica | Marcos Weiss Bliacheris
Consultoria sobre música judaica | Margot Lohn
Captação de recursos | Giuliana Neuman Farias
Fotografias de divulgação | Bernardo Jardim Ribeiro
Redes sociais | Pedro Bertoldi
Assessoria de imprensa | Bebê Baumgarten
Duração: 65 min
Classificação indicativa: 12 anos
Capacidade de público por sessão: 33 pessoas
*As falas de Reli Gizelstein Blau são excertos da entrevista concedida à USC Shoah Foundation
REDES DO ESPETÁCULO:
Instagram: https://www.instagram.com/espetaculoraizamarga
Assessoria de Imprensa:
Bebê Baumgarten Comunicação
Créditos das Fotos:
Bernardo Jardim